Por:
Folhapress
Recém-chegado ao Brasil, o alemão Ralf Rangnick, 61, viu pela televisão a
partida entre Vasco e São Paulo, em São Januário, pelo
Campeonato Brasileiro.
Não ficou muito impressionado. "Acho que podemos ser campeões no ano
que vem", previu. Uma semana mais tarde, assistiu outro jogo, entre
Flamengo e Palmeiras, no Maracanã. "É... Acho que não dá para ser
campeão tão rápido", corrigiu. Diretor esportivo do RB Leipzig e
envolvido em todos os times que pertencem à Red Bull, ele é uma das
peças do planejamento que prevê o Bragantino na Libertadores três anos
após chegar à Série A. Atual líder da segunda divisão, o time pode
confirmar o prognóstico no torneio de 2023.
O acordo de R$ 50
milhões feito com Bragantino neste ano, vai fazer o time se chamar Red
Bull Bragantino apenas em 2020. Na prática, o controle já é da
multinacional de bebidas energéticas. A única referência ao time campeão
paulista de 1990 é o escudo na camisa e o nome Nabi Abi Chedid do
estádio, lembrança do ex-presidente e da família que controlava o clube.
Dentro da estrutura de clube-empresa que existe no País, o Red Bull foi
quem fez o trabalho com prazo mais longo. E com paciência.
O
time foi fundado em 2007 e 11 anos depois, apesar do investimento da
matriz austríaca, estava sem divisão nacional. No Campeonato Paulista
disputa a elite, mas essa não era a prioridade. O objetivo era estar no
principal torneio do futebol nacional. Desde a mudança de Campinas para
Bragança Paulista, o público cresceu. O Red Bull Brasil teve média de
2.875 pagantes nos jogos como mandante do Paulista deste ano. Isso
turbinado pelos confrontos com Palmeiras e Santos. Em seis das nove
partidas no estádio Moisés Lucarelli, o público não chegou a 500
pessoas. O Bragantino tem média na Série B de 6.074.
A
negociação fez dirigentes de outras equipes se queixarem à CBF de que o
Red Bull havia comprado a vaga e pode chegar à Série A. "Desde o
primeiro momento que olhamos o mercado e propusemos isso [a compra do
Bragantino], a preocupação era em criar uma torcida. Com tempo e
investimento, o Red Bull iria atingir as divisões mais altas do futebol
brasileiro. Era questão de continuidade. Mas não conseguiríamos mudar a
relação que tínhamos com a cidade de Campinas. Qual o propósito de
chegar à Série A ou B sem gerar paixão nas pessoas e ter uma cidade em
torno do time?", questiona Tiago Scuro, CEO do Red Bull Brasil.
Poderia
ser questão de tempo, mas a demora por resultados impacientava a
operação internacional da empresa. Especialmente do RB Leipzig, time
alemão que disputa a Champions League. Diretores já haviam dito que, se
dependesse deles, a experiência brasileira teria sido encerrada. A
matriz desejava também que o time usasse apenas jogadores jovens, com
idade inferior a 23 anos. Queixava-se do investimento em veteranos. Dava
trabalho para Scuro e outras pessoas ligadas ao clube brasileiro
explicar que a realidade na América do Sul era outra. Faz-se necessário
gastar com atletas mais velhos.
A folha salarial para a disputa
da Série B está em cerca de R$ 2 milhões mensais. No Paulista, quando a
equipe chegou às quartas de final, foi de R$ 1,5 milhão. O teto salarial
é de R$ 100 mil. A compra do Bragantino representa a chance também de
montar uma equipe a longo prazo, algo que não acontecia com o Red Bull
Brasil. Até 2018 era preciso ter um elenco (mais caro) para o Estadual e
outro (muito mais barato) para a Copa Paulista ou Brasileiro da Série
D.
Os bichos por vitórias, chamados de "acelerador" na
terminologia da empresa, são maiores do que o Palmeiras, por exemplo,
atual segundo colocado da Série A. O Red Bull paga R$ 3 mil por ponto
conquistado. Cada vitória representa R$ 9 mil. Metade do valor é pago
mensalmente junto com o salário. Os outros 50% são guardados em um fundo
a ser distribuído após o acesso que parece ser cada vez mais provável. A
premiação por vitória do Palmeiras é R$ 7 mil.
Se subir para a
elite, o investimento deverá estar na casa dos R$ 50 milhões. Será
direcionado para a infraestrutura. Já como Red Bull Bragantino, o clube
pretende reformar o estádio Nabi Abi Chedid e construir um centro de
treinamento na região de Bragança Paulista. Se o projeto de
clube-empresa, em formatação no Congresso Nacional, for aprovado, a
filial brasileira prevê que os investimentos poderão ser ainda maiores.
"Ainda
não é vantajoso ser clube-empresa no Brasil e a gente espera que essa
questão evolua. [Se for aprovado o projeto] terá um impacto positivo no
mercado e nós teríamos uma eficiência financeira maior. Temos uma
desvantagem de 15% ou 20% em função dos impostos", diz Scuro. Um exemplo
do poder econômico do Bragantino se deu na contratação do atacante
Claudinho. Apesar do interesse de Cruzeiro e Atlético-MG, a empresa
exerceu sua preferência de compra e pagou R$ 2 milhões à Ponte Preta.
"A
gente não está muito preocupado se é Red Bull ou Bragantino, se é uma
multinacional ou a família Chedid. Queremos um time na cidade e se
estiver na primeira divisão, melhor ainda", afirma o comerciante Rafael
de Menezes, 54. Mesmo na principal organizada da equipe, os Guerreiros
do Leão, não há qualquer sinal de incômodo. Há uma questão a ser
resolvida: o mascote. A empresa tem o touro como símbolo.
Pode
parecer insignificante, mas para o empresário austríaco Dietrich
Mateschitz, dono da Red Bull, é relevante. Mesmo nos momentos de maior
crítica ao projeto brasileiro, foi ele quem manteve o investimento e o
Red Bull Brasil em funcionamento. No início do século, ele recebeu a
ideia de patrocinar um nadador brasileiro então em começo de carreira:
César Cielo. Seus assessores montaram um projeto para o atleta que seria
medalhista de ouro nos 50 m livres dos Jogos Olímpicos de Pequim-2008 e
recordista mundial. Mateschitz assistiu aos slides e vídeos do
brasileiro. Não achou boa ideia. "Touro não nada", argumentou na época.